Michelena e Spinelli
A manhã estava iluminada pelo sol outonal. A temperatura agradável da praça fazia daqueles poucos instantes, em que sentávamos para meditar e alinhar algumas ideias que a algum tempo acorriam a nossa mente.
Tínhamos caminhado, Francisco e eu, pela orla do Guaíba que apresentava o aspecto terroso, ocasionado pelas intensas chuvas que abençoaram o nosso solo nos últimos dias.
Olhei para o amigo querido, Spinelli, e comentei:
- Aqui seria um belo lugar para uma feira de livros, não achas?
Ele encarou-me com um brilho no olhar, mesclado com aquele sorriso franco que o distinguia, e fez um movimento de cabeça ao mesmo tempo em que balbuciou:
- Interessante!
- Interessante? Só isso?
O riso afável e cristalino brotou como uma sinfonia cálida e estimulante.
- Sim, interessante porque eu pensei o mesmo que tu, Roberto.
Rimos, muito, os dois e começamos a entretecer considerações para essa ação, avaliando as necessidades, as dificuldades, as probabilidades de auxílio, enfim, o planejamento prévio de uma decisão que começava a se delinear ali e que seria valorosamente defendida na reunião de Diretoria da FERGS, no próximo mês.
Estavamos radiantes com a visão que se nos descortinava aos corações.
Era revigorante compartilhar ideias e ideais com o nosso querido Francisco. Sua tenacidade e entusiasmo, a capacidade de trabalho tornavam qualquer caminho de edificação no bem, atraente e incensava os seus pares de uma vontade férrea de agregarem-se às suas propostas.
Fora assim no Pacto Áureo, fora assim na Caravana da Fraternidade, na campanha pela construção da sede da FERGS, e eu sabia, seria assim nesse empreendimento que ora acalentávamos.
Estava perdido em minhas considerações e reflexões íntimas, quando ouvimos alguém que aproximando-se falava:
- Seu Spinelli, que bom encontrá-lo! Roberto, quanto tempo! Acho que Deus nos reuniu aqui.
Era um conhecido livreiro, amigo nosso, que realmente não víamos a tempo.
- Amigo, disse Spinelli, sim essa reunião foi acertada em algum momento, sorriu bondosamente.
- Pois é Francisco, tu entendes “destas coisas”, mas as vezes eu até acredito.
- Acredite, acredite amigo, disse Roberto, abraçando-o.
O amigo livreiro então disse:
- Preciso de auxílio, de quem se associe a uma ideia que tive.
- Spinelli e eu nos olhamos e disparamos:
- Uma feira do livro na praça!
- Mas quem lhes disse? Eu não comentei com ninguém - e desatou em uma risada gostosa, inclinando-se para trás, numa postura de júbilo, arrematando:
- Eu não posso com vocês! Doravante começarei a acreditar mais nessa história de Espíritos.
Abraçamo-nos e rimos juntos, continuando a conversar e fazer planos para o futuro.
Estava alí, na manhã de sol da praça, em meio ao riso das crianças e o trinado dos pássaros, formado o embrião da Feira do Livro de Porto Alegre.
R. P. Michelena