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Quando surge na família alguém com deficiência/diferença?




Sonia Hoffmann

 

O acolhimento de alguém com a sua deficiência/diferença no seu nascimento é a consolidação do primeiro ato inclusivo que uma família possa realizar. Este planejamento já teve seu início na Espiritualidade, quando os pais aceitaram oferecer a condição para esta oportunidade pedagógica acontecer.

Quando existe uma fundamentação espiritualizada no ambiente familiar, a chegada do Espírito com suas peculiaridades necessárias para o cumprimento reencarnatório dos seus objetivos acontece em um clima de compreensão, amorosidade, companheirismo e generosidade entre os componentes deste núcleo. No entanto, quando os pais ou um dos cônjuges estão distanciados dos ensinamentos morais é possível se instalar estranhamento, revolta, discórdia, culpa, acusação, irritabilidade e mesmo o afastamento/abandono entre o casal ou até em relação à criança. Não havendo entendimento entre os pais, gera-se relacionamento conflituoso e é comum um deles ficar sobrecarregado na responsabilidade de cooperação para o desenvolvimento infantil.

Incontestavelmente, porém, o lar é o melhor e o mais eficiente educandário, porque as lições e aprendizagens nele trabalhadas são vivas e impressionáveis, carregadas de emoção e força. Por tal razão, a família é o conjunto de seres se unindo pela consanguinidade para sua evolução, no qual valores inestimáveis são investidos e que se conjugam a favor dos resultados felizes que devem ser conseguidos ao longo dos anos, graças ao relacionamento entre pais e filhos, irmãos e parentes. A família, nem sempre, entretanto, é constituída por Espíritos afins, fraternos, afetivos, compreensivos. Com frequência, ela é formada para auxiliar na recuperação e reparação dos equivocados, comprometidos em erros morais causados anteriormente. Então, há famílias-bênção e famílias-provação. Nas primeiras, se reúnem os Espíritos identificados nos ideais do lar, na compreensão dos deveres, na busca do amadurecimento moral, beneficiando-se pela harmonia e fraternidade habitual. As outras, se caracterizam pelos conflitos que se apresentam desde cedo, animosidades entre seus membros, disputas alucinadas, conflitos contínuos, revoltas sem descanso (Ângelis, 1997).

O vínculo entre irmãos estabelece as mais variadas conexões ao longo da existência, constituindo-se, muitas vezes, considerável parceria e influência mútua através das interações formadas desde a infância e mesmo pré-nascimento. Muitos são os casos em que, durante a gravidez, os pais já conversam com os outros filhos sobre a chegada de mais alguém na família, preparando-os e incentivando um relacionamento saudável.

Os irmãos podem ser considerados agentes de socialização, pois proporcionam para a criança os primeiros e intensos contextos de inter-relacionamentos. Nessa constância e progressiva ação interativa, eles estabelecem um ensino não formal de habilidades fundamentais para o desenvolvimento da linguagem, da motricidade, do brincar, do manuseio de objetos e de significativas relações sociais, morais e intelectuais (como o compartilhamento, concessões, companheirismo, por exemplo) que serão bastante úteis para a vida futura.

Entretanto, assim como pode acontecer para muitos pais, alguns irmãos podem sentir-se perplexos, desnorteados, confusos e decepcionados com a chegada ou o convívio de uma criança com deficiência ou diferença marcante. As interações, com o tempo, podem ficar fragilizadas, mas também seguirem para o caminho da superproteção. Processos de rejeição, indiferença e até sentimento de (auto)desvalorização podem ter início e se consolidarem - ainda mais quando percebem que seus pais dedicam maior atenção e carinho a aquele filho/a.

Em algumas configurações e dinâmicas familiares, mesmo inconscientemente, irmãos podem ser colocados na situação de cuidadores e de extrema responsabilidade na proteção, cooperação e preocupação, ficando fatigados, ansiosos e desestimulados ao perceberem que talvez tenham de modificar ou abolir os seus propósitos para o cumprimento da tarefa imposta sem o seu pleno entendimento e acolhimento consensual.

A presença de alguma deficiência/diferença na existência de alguém com poucos recursos morais, por sua vez, pode desencadear uma relação de tirania com os outros membros da família. Nesta condição, é comum o estabelecimento de menosprezo, de negação e de falsidade na relação frátria. Porém, se já existe progresso moral e intelectual em todos ou em um dos irmãos, é possível o desenvolvimento de um sistema educativo e até estimulante para a modificação familiar, mesmo quando haja o reconhecimento de imposições descabidas.

Assim, é perceptível não ser a presença da deficiência/diferença o elemento primordial de alteração interrelacional e sim o desenvolvimento e a conduta moral de cada um e do grupo familiar, pois há irmãos que se alegram e não sentem-se envergonhados ou excluídos por terem alguém com deficiência/diferença no seu contato próximo de família.

Alguém, desde a infância, e como enfatiza Joanna de Ângelis (1997), na adolescência naturalmente experimenta, em um lar desajustado, as consequências prejudiciais dos acontecimentos de agressividade e luta que ali têm lugar, escondendo as próprias emoções ou recorrendo aos vícios a fim de sobreviver, por sentir-se carregado de amargura e asfixiado pelo desamor. Apesar dessa situação angustiante, cabe ao adolescente em formação da personalidade buscar a compreensão da circunstância na qual se encontra localizado, aceitando o desafio e a experiência, compadecendo-se dos genitores e demais familiares envolvidos na luta infeliz como sendo seres enfermos, longe da cura ou se negando a terapia da transformação moral. Sem dúvida, este é um pesado desafio enfrentado pelo jovem: pagar o elevado ônus, que é entender aqueles que deveriam fazê-lo, ajudar aqueles que, por serem mais velhos e, provavelmente, mais experientes, tinham por tarefa compreendê-lo e orientá-lo. O lar consiste no grande formador do caráter do educando. Muitas vezes, no entanto, lares infelizes, nos quais as discussões por ninharias se fazem cruentas e constantes, não chegam a perturbar adolescentes equilibrados, porque já são Espíritos saudáveis e ali se encontram para resgatar, mas também para educar os pais, servir de exemplo para os irmãos e demais familiares. Assim, o adolescente precisa compreender que tem, para com a família, uma dívida de carinho porque serviram de instrumento para sua reencarnação, mesmo quando essa não se dê conta do imenso débito que tem para com o jovem em formação. Nessa tentativa, o de compreender e desculpar, pela oração, o adolescente poderá contar com o auxílio divino e a proteção dos seus amigos Espirituais, que são responsáveis pela sua nova experiência reencarnatória.

Assim, da mesma maneira como os pais de crianças com deficiência/diferença, os filhos que têm irmãos e irmãs nesta condição necessitam de atenção, de compreensão e de apoio especiais. Acima de tudo, sua contribuição singular para o sistema familiar precisa ser entendida e reconhecida (Powell; Ogle, 1992).

Por tal motivo, é importante e necessária que nas atividades da instituição espírita, como a Evangelização infantojuvenil e Atendimento aos Pais, a temática sobre inclusão e procedimentos de cuidados com a saúde mental, moral e intelectual dos componentes familiares sejam amplamente trabalhados, aprimorando e fortalecendo os vínculos familiares saudáveis.

 

Referências

 

ÂNGELIS, Joanna de. Adolescência e vida. Psicografia de Divaldo P. Franco. Salvador: Editora Leal, 1997.

POWELL, Thomas; OGLE, Peggy Ahrenhold.  Irmãos especiais: técnicas de orientação e apoio para o relacionamento com o deficiente. São Paulo: Maltese Norma, 1992.

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