Sustentabilidade e inclusão
Sonia Hoffmann
O ser humano vive e convive em múltiplos contextos, os quais o influenciam e são influenciados por ele a partir das suas particularidades biofísicas, ações, personalidade, temperamento e, em uma perspectiva espírita, da bagagem espiritual de cada pessoa formada ao longo das existências.
O contexto planetário apresenta inúmeros recursos que possibilitam e favorecem o desenvolvimento de alguém, porém, estes recursos (água, minérios, ar, fontes de energia, espécies animais e plantas) são limitados, característicos e restritos a determinados espaços geográficos. Sua exploração inadequada, o mau uso e o consumo desmedido pela humanidade podem provocar um desequilíbrio bastante destrutivo e nocivo para a sobrevivência individual e coletiva.
Soler e Conangla (2011) ponderam, neste sentido, que a administração deste possível risco é, atualmente, o mais importante desafio científico e tecnológico que se apresenta às sociedades no que se refere ao meio ambiente. "Trata-se de tornar sustentável e seguro o (excessivo e não sustentável) consumo de recursos e, consequentemente, o aumento dos riscos implicado nessa forma de agir" (p.64).
Frequentemente, sustentabilidade é relacionada somente à preservação e aproveitamento equilibrado das condições naturais, climáticas, econômicas do meio ambiente. Entretanto, "também em nosso mundo afetivo existe um grande manancial de recursos que podem facilitar nossa vida no sentido da maior e melhor adaptação a nosso ambiente, da consecução de nossos objetivos de vida e do cultivo de relações pessoais mais satisfatórias. Não obstante, esses recursos têm limites que dependerão, em boa medida, da qualidade de nossa gestão. Por exemplo, a boa gestão de nossos recursos emocionais fará com que nossas fontes de energia - a esperança, a automotivação ou a alegria – se tornem energias recicláveis. A gestão incorreta pode levar, no entanto, a ira a se transformar em ressentimento e ódio, e fazer com que a energia que esses sentimentos produzem se perca ou seja usada para destruir. Nossos sentimentos são materiais delicados que não podem ser usados de qualquer jeito. Colocar em prática uma gestão inteligente é algo que depende de nós" (Soler; Conangla, 2011, p.65).
Portanto, é significativo pensar na influência e no gerenciamento de sustentabilidade dos determinantes e diversos fatores sociais nas constantes interações de alguém e do grupo social como um todo, ao longo do seu ciclo vital. Como Urie Bronfenbrenner (1996) assinala, na sua teoria ecológica do desenvolvimento humano, o ambiente em que cada um cresce e vive afeta todos os planos da nossa vida (modo de pensar, as emoções sentidas, ou gostos e preferências) a partir de ambientes em que alguém está diretamente inserido até aqueles que atuam sobre seu sistema de crenças e regularização sem que ele tenha uma participação efetiva ou imediata.
Assim, ações includentes ou excludentes que aconteçam, por exemplo, no ambiente do grupo familiar (como microssistema) podem ser introjetadas pela pessoa, definindo comportamentos que podem ser transpostos e repercutir para outros microssistemas (como a escola, instituição espírita...). Nesta relação ambiental, acontece então uma articulação de ações fundamentais para a constituição sustentável do ser (um diálogo entre estes microssistemas). Contudo, para estes microssistemas são levados, muitas vezes, conceitos, concepções e convicções adquiridos ou absorvidos por outras pessoas (como preconceitos, superstições, estigmas, estratégias equivocadas...) sem que a pessoa com deficiência ou diferença esteja diretamente presente (como o local de trabalho dos seus pais, escolas dos seus irmãos, por exemplo). Com estas ideias nem sempre adequadas para uma interação sadia, são transpostos para o ambiente familiar as informações recolhidas, alterando a relação com a pessoa com deficiência/diferença). O próprio sistema cultural da sociedade em que a pessoa está inserida pode, ao mesmo tempo, ser favorável ao seu desenvolvimento como ser incluído ou excluído, em uma determinada historicidade de tempo e espaço, ainda mais quando se formam legislações e diretrizes que abordem a inclusão como um avanço na qualidade interativa ou com ela não se ocupem.
Logo, é extremamente importante pensar e agir para que a relação inclusiva seja algo sustentável e equilibrada para que o ser humano não venha a passar por dificuldades em sua emancipação evolutiva como Espírito imortal. Joanna de Ângelis (2013) sugere que o ser humano "é o que acalenta no íntimo. Sua vida mental se expressa na organização emocional e física, dando surgimento aos estados de equilíbrio como de desarmonia pelos quais se movimenta. A conscientização da responsabilidade imprime-lhe destino feliz, pelo fato de poder compreender a transitoriedade do percurso carnal, com os olhos fitos na imortalidade de onde procede, em que se encontra e para a qual ruma" (p.21).
Como argumenta Léon Denis (2014), em seu livro O grande enigma, em uma perspectiva sustentavelmente inclusiva, "cada Alma é uma irradiação da grande Alma universal, uma centelha gerada do Eterno Foco. Nós, porém, nos ignoramos a nós mesmos, e essa ignorância é a causa de nossa fraqueza e de todos os nossos males. Estamos unidos a Deus na relação estreita que liga a causa ao efeito, e somos tão necessários à sua existência quanto Ele é necessário à nossa. Deus, Espírito Universal, manifesta-se na Natureza, e o homem é, sobre a Terra, a mais alta expressão dessa Natureza. Somos a criação e a expressão de Deus, que é a fonte do Bem. Mas esse Bem, eu o possuo somente no estado de gérmen, e nossa tarefa consiste em desenvolvê-lo. Nossas vidas sucessivas, nossa ascensão na espiral infinita das existências, não têm outro fim. Tudo está escrito no fundo da Alma em caracteres misteriosos: o passado, de onde emergimos e devemos aprender a sondar; o futuro, para o qual evolvemos, futuro que nós mesmos edificaremos qual monumento maravilhoso, feito de pensamentos elevados, de nobres ações, de devotamentos e de sacrifícios. A tarefa que cada um tem a realizar resume-se em três palavras: saber, crer, querer - isto é, saber que temos recônditos e inatos recursos incalculáveis; crer na eficiência de nossa ação sobre os dois mundos, o da Matéria e o do
Espírito; querer o Bem, dirigindo o nosso pensamento para o que é belo e grandioso, conformando as nossas ações com as leis eternas do trabalho, da justiça e do amor [..] "É a ignorância da nossa natureza e das forças divinas que dormem em nosso íntimo, é a ideia insuficiente que fazemos do nosso papel e das leis do destino que nos entregam às influências inferiores, ao que chamamos o Mal. Na realidade, o fato se reduz a uma falta de desenvolvimento. O estado de ignorância não é, por si mesmo, um mal; é somente uma das formas, uma das condições necessárias da lei de evolução. Nossa inteligência não amadureceu ainda; nossa razão, criança, tropeça nos acidentes do caminho; daí o erro, os
desfalecimentos, as provações, a dor. Mas todas essas coisas serão um bem se as considerarmos outros tantos meios de educação e elevação. A Alma deve atravessá-las para chegar à concepção das verdades superiores, à possessão da parte de glória e de luz, que fará dela uma eleita do céu, uma expressão perfeita do Poder e do Amor infinitos. Cada ser possui os rudimentos de uma inteligência que atingirá o gênio e tem a imensidade dos tempos para desenvolvê-la". Cada vida terrestre é uma escola, a escola primária da Eternidade.
O Movimento Espírita, em toda sua estrutura organizacional, carece urgentemente de pensar e repensar em como informar e esclarecer não somente em relação a uma sustentabilidade teórica de inclusão, mas em ações e considerações estratégicas de efetivação funcional e prática que promovam a valorização da vida e do ser como repleto de possibilidades que podem se desenvolver conforme a motivação, o estímulo e a personalidade, mesmo que pessoas compartilhem o mesmo recurso ambiental sistêmico.
Referências
ÂNGELIS Joanna de (Espírito). Autodescobrimento: uma descoberta interior. Psicografia de Divaldo Franco. 17. ed. Salvador: LEAL, 2013. Série Joanna de Ângelis, v. 6.
ASSIS, Diana Cavalcante Miranda de; MOREIRA, Lúcia Vaz de Campos; FORNASIER, Rafael Cerqueira. Teoria bioecológica de Bronfenbrenner: a influência dos processos proximais no desenvolvimento social das crianças. Research, Society & Development, v. 10, n. 10, e582101019263, 2021. doi: http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v10i10.19263.
BRONFENBRENNER, Urie. Ecologia do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, 1996.
DENIS, León (Espírito). O grande enigma. Brasília, DF: FEB, 2014.
SOLER, Jaume; CONANGLA, María Mercé. Ecologia emocional. Rio de Janeiro: Best Seller, 2011.
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